sábado, 7 de abril de 2012

O ovo de Jeremias


O OVO DE JEREMIAS
(por Ida Mae Kempel)

Jeremias nasceu com um corpo torto e uma mente retardada.
Aos doze anos de idade ele ainda estava no segundo ano e
parecia incapaz de aprender. Sua professora, Doris Miller,
sempre perdia a paciência com ele. Ele ficava se contorcendo
em sua carteira e fazendo ruídos guturais. Em outras ocasiões
ele falava de modo claro e preciso, como se um raio de luz
penetrasse nas trevas do seu cérebro. Todavia, na maior
parte do tempo, Jeremias irritava sua professora.

Certo dia ela chamou os pais e pediu que fossem à escola
Santa Teresa para uma conversa. Quando o casal Forrester se
sentou na sala de aulas vazia, Doris disse a eles:

- Jeremias deveria estar em uma escola especial. Não está certo
que ele fique com crianças mais novas que não têm problemas de
aprendizado. Ora, existe uma margem de cinco anos entre sua
idade e a dos outros alunos!

A Sra. Forrester chorou baixinho, escondendo a boca em um
lenço. Seu marido falou:

- Sra. Miller - disse ele - não existe nenhuma escola desse tipo
na redondeza. Mas não estava certo mantê-lo em sua classe.
Ela tinha 18 outros alunos mais novos para ensinar, e Jeremias
era uma distração para eles. Além do mais, ele nunca iria
conseguir aprender a ler ou escrever. Por que desperdiçar
mais tempo tentando?

Enquanto ela pensava nisso, um sentimento de culpa caiu
sobre ela. "Oh Deus," falou em voz alta, "aqui estou eu
reclamando quando meus problemas não são nada
comparados com aquela pobre família! Por favor,
me ajude a ser mais paciente com Jeremias!"

Daquele dia em diante, ela tentou ignorar os ruídos que
Jeremias fazia e também seus períodos de incapacidade
de se comunicar com o ambiente que o cercava. Então
um dia ele chegou até sua mesa, arrastando atrás de si
sua perna dormente.

- Eu amo você, Srta. Miller - exclamou ele em voz alta o
suficiente para que toda a classe ouvisse. Os outros alunos
deram risinhos e o rosto de Doris ficou vermelho. Ela
gaguejou ao responder:

- Mu.. muito obrigada, Jeremias. Agora volte para o seu lugar.

Chegou a primavera e as crianças começaram a falar
entusiasmadas sobre a Páscoa que chegava. Doris contou
para eles a história de Jesus, e então para dar mais ênfase
à idéia da nova vida brotando, deu a cada uma das crianças
um ovo de plástico que podia ser aberto.

- Vejam - disse ela - quero que vocês levem isto para casa e
o tragam amanhã com alguma coisa dentro que mostre uma
nova vida. Entenderam?

- Sim, Srta. Miller! - as crianças responderam com entusiasmo.
Todos, menos Jeremias. Ele apenas ouviu atento com seus olhos
fixos na face da professora. Ele não fez seus ruídos de sempre
naquele momento.

Teria ele entendido o que ela ensinou sobre a morte de Jesus
e Sua ressurreição? Será que ele entendeu a tarefa que devia
fazer? Era melhor ela ligar para seus pais e explicar a eles o
que era para ele fazer com o ovo.

Naquela noite, a pia da cozinha de Doris parou de funcionar.
Ela chamou o senhorio e esperou uma hora até que ele viesse
consertar. Depois disso, ela ainda teve que fazer compras,
passar uma blusa e preparar uma prova de vocabulário.
Acabou se esquecendo completamente de ligar para os pais
de Jeremias.

Na manhã seguinte, 19 crianças chegaram na escola, rindo e
conversando enquanto colocavam os ovos sobre uma grande
cesta sobre a mesa da Srta. Miller. Depois da aula de
matemática, era hora de abrir os ovos.

No primeiro ovo, Doris encontrou uma flor.

- Sim, uma flor é certamente um sinal de uma nova vida - disse
ela. - Quando as plantas começam a brotar, sabemos que
chegou a primavera.

Uma menininha na primeira fileira levantou a mão.

- Esse é o meu ovo, Srta. Miller.

O próximo ovo continha uma borboleta de plástico, que
parecia de verdade. Doris levantou ela para todos verem.

- Sabemos que uma lagarta se transforma em uma linda
borboleta. Sim, isto é nova vida também.

A pequena Juddy sorriu orgulhosa e disse:

- Srta. Miller, esse é o meu ovo!

Em seguida, Doris abriu um que tinha uma pedrinha coberta
de musgo. Ela explicou que o musgo também significava vida.
Billy falou lá do fundo da classe:

- Meu pai me ajudou!

Então Doris abriu o quarto ovo. Ela ficou muda. O ovo estava
vazio! Na certa era o ovo de Jeremias e ele não entendeu a tarefa
que lhe fora dada. O pior é que ela tinha esquecido de telefonar
para os pais dele! Para não embaraçá-lo, ela colocou o ovo de
lado e foi pegar o seguinte. Mas o atento Jeremias falou:

- Srta. Miller, não vai falar nada do meu ovo?

Embaraçada, Doris respondeu:

- Mas Jeremias, seu ovo está vazio!

Ele olhou bem nos olhos dela e disse com voz suave:

- Sim, mas o túmulo de Jesus estava vazio também! Jesus
foi morto e colocado ali. Então Seu Pai o ressuscitou!

O sino do recreio tocou. Enquanto as crianças corriam
para fora, Doris chorava. A frieza dentro dela acabava de
derreter completamente.

Três meses depois, Jeremias morreu. Aqueles que
compareceram ao funeral não conseguiam entender a
razão dos 19 ovos de plástico vazios que havia sobre
seu pequeno caixão.


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